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Portugueses com medo da guerra na Ucrânia

Portugueses com medo da guerra na Ucrânia

Inimaginável, atroz e repugnante. É assim que, de uma forma geral, os portugueses classificam o conflito vivido na Ucrânia desde a madrugada do negro dia 24 de fevereiro, que fica gravado na história com a entrada das tropas russas naquele país. Uma guerra que se vive mesmo aqui “ao lado”, no leste da Europa, e que está a afetar, direta e indiretamente, a vida dos portugueses, há precisamente um mês.

Além do aumento do custo de vida e do espoletar de uma nova crise económica, consequências que se começaram a fazer sentir, em Portugal, cerca de quinze dias depois da invasão russa, a saúde mental dos portugueses começou a ser afetada assim que surgiram as primeiras notícias dos bombardeamentos no país liderado por Volodymyr Zelensky. Esse poderá ser, no momento, o principal problema que afeta os portugueses.

“Tenho episódios de ansiedade, com alguma frequência, e sinto que, agora, as crises acontecem com um intervalo de tempo menor”, partilhou Patrícia Cardoso, uma das muitas pessoas que a VIVA! contactou sobre o assunto. Uma opinião que é experienciada também por Vítor Bastos, que, embora nunca tenha recebido um diagnóstico de ansiedade, admitiu ter-se sentido muito mais “fragilizado” nos últimos tempos, por consequência das múltiplas notícias, imagens, vídeos e testemunhos que chegam da Ucrânia.

Por sentir que o consumo de informação, em quantidade excessiva, não lhe estava a “fazer bem psicologicamente”, Ana Isabel Araújo teve mesmo que se “desligar um pouco das notícias”. “É impossível olhar para as imagens e não sentir tristeza, revolta e pensar que podíamos ser nós”, afirmou, incrédula por presenciar, em 2022, algo semelhante ao que aconteceu na segunda guerra mundial e que se recorda vivamente, dos tempos de escola.

Este é um conflito que está a provocar um aumento significativo de medo, preocupação e ansiedade na generalidade da população portuguesa. “A ansiedade surge em situações de perigo iminente, insegurança e incerteza”, pelo que, neste período, e ainda com uma pandemia a afetar-nos, acaba por ser uma “resposta natural face à incerteza das consequências diretas e indiretas que a guerra poderá trazer na vida de cada um de nós”, sublinhou o psicólogo Pedro Coutinho, especialista em ansiedade e depressão.

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“Esta situação aumenta o nosso sentimento de vulnerabilidade e ameaça o nosso bem-estar, pelo que é natural que as pessoas se sintam ansiosas ou vejam os seus níveis de ansiedade habituais aumentados. Recebi, inclusive, algumas partilhas de pessoas que experienciaram níveis de ansiedade patológicos face às notícias de guerra pela primeira vez”, revelou, indicando que a ansiedade é, até certo ponto, adaptativa. No entanto, alertou, quando se manifesta de forma intensa, se prolonga no tempo e/ou tem impacto nas diversas áreas da nossa vida passa a ser considerada patológica.

Para Fábio Pereira, que admite só se ter começado a aperceber da dimensão do conflito posteriormente, preocupa-o o “massacre” que os ucranianos estão a sofrer, sobretudo as crianças, que considera “as maiores vítimas do conflito”. Contudo, pensa também na fatura que os restantes países, e Portugal, em particular, começam já a pagar. “Aumento dos preços dos combustíveis, do peixe, da carne, da fruta e dos legumes são alguns dos exemplos”, enumerou, realçando que “a situação económica do país já não estava propriamente confortável” e que, agora, “ficará ainda pior”.

“Acredito que daqui para a frente toda a situação irá piorar, tanto a nível da procura de trabalho e gastos mensais assim como no que respeita ao número de refugiados que irão precisar de apoio. Sem esquecer, claro, a preocupação máxima que é se Portugal tiver que participar nesta guerra”, completou, por sua vez, Ana Isabel Araújo.

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São receios particulares que se estendem à maioria dos portugueses e que seguem, até, um determinado padrão, como comprova o testemunho do clínico Pedro Coutinho. “Inicialmente, os principais anseios e preocupações estavam, sobretudo, relacionados com as consequências diretas que a guerra podia ter para a paz e segurança mundial, nomeadamente ao existir a possibilidade de uma terceira guerra mundial ou nuclear. Atualmente, os receios vão muito além disso! Uma guerra traz sempre consequências negativas para as economias dos países, por isso é já visível um aumento da preocupação, da insegurança e, até, dos níveis de ansiedade da população com a possibilidade de uma nova crise económica”.

De forma, a neutralizar ou impedir o aumento do número de casos de ansiedade, é necessário que os cidadãos estejam atentos aos sinais que o seu corpo manifesta e apliquem algumas “técnicas de gestão de ansiedade no dia-a-dia”. “Aceitar o que estamos a sentir” é, segundo o psicólogo, o primeiro passo. É fundamental que os cidadãos “não evitem ou escondam o que estão a sentir por receio do que os outros possam pensar”. Afinal, todas as formas de reação ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia são válidas.

Nos momentos de maior ansiedade, o psicólogo aconselha também a presença de um pensamento deveras pertinente, o de que tudo o que se lê e ouve se baseia na situação atual, mas, também, em hipóteses sobre tudo o que poderá (ou não) acontecer. “Em alturas de maior ansiedade, a nossa mente tende a focar-se apenas no pior cenário possível (a catastrofizar), aumentando ainda mais o medo e a ansiedade”, pelo que é importante, nessas alturas, “questionar a verdadeira probabilidade do «pior cenário possível» acontecer e, simultaneamente, procurar “focar-se em pensamentos que aumentem os sentimentos de segurança e/ou de confiança”.

“Nesta situação, em concreto, podemos ter em mente que já existiram várias guerras onde participaram países com armamento nuclear sem que este tenha sido utilizado ou ter em consideração que há milhares de pessoas, em todo o mundo, a tentar trabalhar e negociar uma solução que proteja a paz, as economias e o bem-estar mundial”, exemplificou, acrescentando que, muitas vezes, também o envolvimento direto em iniciativas humanitárias poderá diminuir o “sentimento de impotência face à situação atual” e “reduzir os níveis de ansiedade”, através da realização de uma atividade útil.

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E, nesse sentido, recorde-se, os portugueses têm sido exímios! Desde o início do conflito que se uniram e colocaram mãos à obra para ajudar o povo ucraniano, dividindo-se entre a recolha de produtos de primeira necessidade, a distribuição dos mesmos e de oferta de transporte a refugiados, numa verdadeira onda de solidariedade. Contudo, quando questionados sobre a possibilidade de uma tomada de posição mais ativa por parte da OTAN (NATO) – Organização do Tratado do Atlântico Norte, as opiniões divergem. Se, na perspetiva de Vítor Bastos, a organização deveria estar a ser mais interventiva, ultrapassando a questão diplomática, que impede, legalmente, a sua ajuda no terreno, por outro Patrícia Cardoso considera que se isso acontecesse seria, efetivamente, o “combustível para uma terceira guerra mundial na Europa”.

“É uma situação muito complicada de gerir. Por um lado, sinto que os ucranianos foram deixados ao abandono, mas a entrada da NATO no conflito seria mesmo dar início a uma terceira guerra mundial e acredito que a maior parte dos países não quer isso”, destacou Ana Isabel Araújo, que teme as represálias que o seu país possa sofrer com esta hipótese.

São, como referiu a vimaranense, apenas hipóteses, que se vão falando e ouvindo nos órgãos de comunicação social, que são debatidas e, naturalmente, ficam a maturar na cabeça dos portugueses, que, volvidos dois anos da emergência de uma pandemia ainda se sentem fragilizamos. “A situação pandémica afetou não só as economias de muitas famílias portuguesas, mas também a sua saúde mental. Por isso, é natural que além de anseios e preocupações possa surgir algum desânimo, ou mesmo desesperança no futuro”, justificou o psicólogo.

Mas, alertou, quando os níveis de ansiedade não diminuírem, se prolongarem no tempo e/ou impactarem o dia-a-dia dos cidadãos é imperativo procurar um “profissional de saúde qualificado”.

O que fazer nos momentos de “ansiedade”

Os conselhos do psicólogo Pedro Coutinho, especialista em ansiedade e depressão

1. Aceitar o que estamos a sentir. É natural que numa situação de guerra inédita sintamos ansiedade, tristeza, insegurança, medo, preocupação, raiva, … Todas estas emoções são válidas e não são sinónimo de drama ou fraqueza!

2. Reforçar as rotinas saudáveis. Tempos instáveis requerem que as pessoas cuidem ainda mais da sua saúde mental, dado que vai ser exigido um esforço extra para lidar com situações novas e geradoras de stress/ansiedade. Por exemplo, é muito fácil descurar completamente os horários de sono ao não conseguir desligar das notícias que vão chegando. No entanto, ninguém consegue cuidar da sua saúde mental sem estes três pilares: alimentação saudável, prática de exercício físico e descanso adequado.

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3. Procurar fontes de informação fidedignas. A par de acontecimentos importantes existe sempre muita desinformação, dado que há pessoas que se aproveitam destas situações para partilhar vídeos antigos e assustar a população através do medo e do pânico.

4. Limitar o tempo dedicado a este assunto. Não é benéfico para a saúde mental perder horas a ver notícias ou falar sobre este assunto. Devemos limitar o tempo dedicado a este assunto e reservar apenas alguns períodos do dia para nos mantermos atualizados.

5. Não ter medo de pedir ajuda! A partilha de emoções com um familiar, um amigo ou alguém próximo pode ser benéfica e apaziguar alguns dos nossos receios/medos. No entanto, quando isso não for suficiente deve-se recorrer a ajuda especializada médica e/ou psicológica.

6. Cuidar da ansiedade, tendo em conta a sua intensidade e o impacto que tem no dia-a-dia. A ansiedade vai manifestar-se de forma diferente em cada pessoa. Para alguns portugueses colocar estes pontos em prática será suficiente. Outros terão de recorrer a técnicas de gestão de ansiedade, onde a realização da respiração diafragmática ou o relaxamento muscular progressivo são especialmente úteis na gestão da ansiedade do dia-a-dia. No entanto, há pessoas que poderão ter de recorrer a profissionais de saúde ou à sua medicação ansiolítica SOS e está tudo bem. O importante é sabermos os cuidados que a ansiedade nos exige em cada momento.

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