Um novo mercado para nichos
A internet e as suas possibilidades colaborativas revolucionaram domínios como o próprio jornalismo, a arte e a literatura. Há autores para nichos e editoras para esses segmentos de mercado. Falamos com dois autores que arriscaram e que hoje apresentam a sua obra ao público. Falamos com Cristina Pimentão e Tiago Gonçalves.
Vivemos atualmente num frenesim potenciado pela internet, essa aldeia global. Com efeito, conseguimos estar ligados a todo o mundo a uma velocidade incrível. É a economia de bits em seu esplendor.
A participação e a voz das “massas” fazem-se sentir. Assunto diferente é obter a atenção do público. O caminho passa, muitas das vezes, por se centrar num nicho de mercado com determinados hábitos, gostos e idade.
Neste “mar criativo”, a oferta é grande. Todos fazem parte deste mundo “conectado”, o que se traduz em mudanças em diferentes áreas, como o próprio jornalismo.
Mas há mais setores que sofreram alterações neste contexto de mudança. O mercado livreiro, a título de exemplo. Agora há possibilidades mais abertas (com a criação de muitas editoras, seja de pequena ou média dimensão) de publicar um livro. As edições independentes multiplicam-se. E é neste contexto que falamos com Cristina Pimentão e Tiago Gonçalves. O que os motivou a editar uma obra neste contexto de mudança? Como têm vivido esta experiência? Podemos continuar a seguir as suas histórias?
“Não foi um processo difícil, digo eu. Mas eu não tinha qualquer experiência, prévia, de publicação e de contacto com editoras. Pesquisei algumas editoras que considerei poderem estar recetivas ao conteúdo do meu livro e estabeleci o contacto. Contudo, constatei que o processo de enviar uma proposta para um livro, para uma editora, parece ser semelhante ao envio de currículos espontâneos: a maioria das editoras não responde, duas ou três respondem dizendo que vão passar a proposta à direção editorial e se houver interesse nos contactam ou informam que a proposta não se enquadra no seu plano editorial. Até que uma, no meu caso a Chiado Editora, manifestou interesse em publicar. E a experiência de parceria que tenho com a Chiado tem sido ótima”, começa por nos explicar Cristina Pimentão, autora.
O mesmo nos diz Tiago Gonçalves, reconhecendo que “nunca é um processo fácil, é necessário gerir bem as expectativas. Como não é o meu primeiro livro, já estava preparado, tive algumas respostas positivas, algumas negativas e a maioria nem sequer respondeu… É um processo moroso, que se torna mais difícil para autores ainda desconhecidos, como eu”.
As redes sociais neste contexto em mutação tornam-se basilares. “A minha experiência de uso profissional das redes sociais é francamente positiva. Mas considero não ter ainda explorado todo o seu potencial. Não sou perita neste domínio e talvez necessite de ajuda profissional técnica para potenciar o uso das redes sociais na minha atividade. Foi na minha página de Facebook que comecei a partilhar alguns pequenos textos, uma espécie de ‘curtas’, para tomar o pulso à recetividade dos leitores. O Facebook foi uma espécie de estirador que me permitiu estender palavras e partilhá-las. O feedback foi positivo e motivou-me a continuar”, conta-nos, entusiasmada, Cristina.
Tiago Gonçalves reconhece, também, que “as redes sociais são um meio importante pois permitem contactos mais rápidos e alargados. É possível chegar a mais pessoas e algumas inacessíveis de contactar de outra forma. Acho que agilizam e dinamizam todo esse processo, ajudam a projetar e a divulgar o meu trabalho, apesar dos contactos serem mais impessoais. Para mim são muito importantes até por viver fora do país”.
A recetividade do público
“Tenho estado a receber feedback das pessoas mais próximas de mim que leram ou estão a ler o livro, e que vão partilhando os pensamentos, insights e emoções que experienciaram. O feedback é positivo, carinhoso e quente. Acho que haverá sempre uma palavra, um parágrafo, uma crónica com os quais, num determinado momento, qualquer leitor se pode identificar”, refere-nos Cristina Pimentão.
“A recetividade tem sido boa, no geral, sobretudo por não ser tão convencional a minha escrita. Tenho obtido feedback variado e tenho tido boas críticas”, diz-nos Tiago Gonçalves.
Crítica: “Que sombra te acompanha”, Tiago Gonçalves
O livro ”Que sombra te acompanha” aborda de uma forma direta o fenómeno da emigração e seus contornos.
Não é, com efeito, um processo fácil, e embora as expectativas de uma vida melhor dominem, as raízes não se perdem. Tornam-se, ao contrário do que se possa imaginar, mais vivas com a passagem do tempo. É isto que se passa com a personagem principal, que aliás, podia ser um de nós. E é aqui que, a nosso ver, a narrativa faz toda a diferença.
Na sua obra, Tiago Gonçalves parte de situações do dia a dia, com um certo caráter autobiográfico. É esse o seu grande ponto diferenciador?, perguntamos. “Em parte sim, utilizo muito o quotidiano e parto das minhas próprias experiências, mas acho que também me diferencio por tornar as obras bastante pessoais, toco muito na parte emocional do leitor, tento que se relacione com o que escrevo e encontre alguma afinidade com o que está escrito. Acho sempre que o que escrevo pode ser vivido por qualquer pessoa, seja direta ou indiretamente”, diz-nos o jovem autor.
E acrescenta: “em setembro vou estar presente na Feira do Livro do Porto e tenho planos para apresentar o livro na Bertrand da Guarda e numa Bertrand da cidade do Porto. Contactos estão feitos nesse sentido”.
Crítica: “Viver, a arte maior de acertos constantes”, Cristina Pimentão
No livro “Viver, a arte maior de acertos constantes”, através de pequenas crónicas, Cristina Pimentão incita-nos à reflexão sobre pedaços do quotidiano. O dia a dia como mote, numa abordagem positiva, em que os temas incitam-nos à reflexão.
“ O livro, em pequenos textos, fala daquilo que é relevante na nossa dinâmica, funcional ou disfuncional, de vida (a morte, o amor, o desamor, o trabalho, os nossos perpétuos recomeços, o perdão, o desapego, a gratidão). Mas não pretende ser prescritivo para a vida de ninguém. Não estou armada em arauto da verdade, nem em apontar princípios morais para que as pessoas orientem o seu comportamento. Não pretendo ser um código deontológico. Prefiro pensar que sou uma espécie de condutora de uber ou cabifay que convida o leitor a entrar na reflexão durante uma curta viagem. Talvez o leitor queira voltar a viajar comigo, talvez não. Mas durante a viagem, comigo, quero desafiá-lo a pensar na bagagem, de vida, que transporta, onde está e para onde quererá ir”, revela Cristina Pimentão.