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Germano Silva

Germano Silva
Um Homem do Porto

O historiador e jornalista Germano Silva é indubitavelmente, um homem do Porto. Nasceu em 1931, num período conturbado entre duas grandes guerras, numa pequena aldeia de Penafiel, mas “quase por acidente”, porque a vida dos seus pais girava, permanentemente, entre S. Martinho de Recezinhos e a cidade do Porto. Cresceu num ambiente marcado pela segunda guerra mundial e por algumas dificuldades financeiras. Passou por vários empregos antes do jornalismo, mas foi no mundo da imprensa que descobriu os caminhos mais recônditos e apaixonantes do porto, cidade a que profundamente se dedicou.

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A fotografia mais antiga que Germano Silva guarda da sua infância, com menos de um ano, foi tirada na Fotografia Beleza, na Rua de Santa Teresa, no Porto, e assinala a sua vinda, juntamente com os pais e dois irmãos, para o Porto. Até aos sete anos a sua infância foi passada entre a casa dos avós, em Penafiel, onde se lembra “que lá havia o que comer”, e o Porto, onde os seus pais moravam. Depois quando iniciou a então instrução primária, num edifício na Rua D. Manuel II, e durante a segunda Grande Guerra, radicou-se definitivamente no Porto. Quando terminou a primária, aos 11 anos de idade, foi logo trabalhar. “A minha professora ainda pediu à minha mãe para que eu continuasse os estudos, mas o dinheiro era preciso lá em casa”, conta. Começou por trabalhar como marçano numa retrosaria na Rua de Santa Catarina, onde ganhava 80 escudos por mês, quantia que servia para ajudar o seu pai, um guarda-freios da antiga Companhia de Carris de Ferro do Porto, a pagar a renda da casa. No entanto, a atitude mais descontraída que Germano tinha não se adaptava à rigidez e ao vestuário formal a que este emprego obrigava. O historiador conta que se despediu, “disse ao proprietário que não queria continuar, ele disse para eu pensar melhor e depois para lá voltar. Nunca mais lá apareci”. Depois ingressou numa fábrica de fósforos, mas um dia no caminho para o trabalho encontrou um amigo. Perguntou-lhe onde trabalhava e disse-lhe que a Fábrica de Lanifícios de Lordelo pagava melhor, Germano candidatou-se então para um lugar naquela empresa e ficou lá, desde os 14 até aos 20 anos. Durante este período, e consciencializado de que não era esta a vida que queria ter, inscreveu-se num curso noturno, na escola de Oliveira Martins.
A morar com a sua família numa “ilha”, a tradicional habitação das famílias pobres da altura, no Porto, e com o nascimento de mais uma irmã, o espaço ficou muito pequeno, pelo que teve de sair de casa. O Lar de Nazaré, um lar de operários dirigido por um frade dominicano, foi a solução. Foi para lá viver alguns anos. Mais tarde, Germano Silva fez a sua instrução militar em Penafiel, nos anos 50, e foi aqui que conheceu aquele que viria a ser o seu chefe na Secção Desportiva do seu primeiro emprego, no Jornal de Notícias, Freitas Cruz. Depois de voltar do serviço militar, conseguiu um emprego como escriturário no Hospital de Santo António – graças a um encontro, durante uma noite no café Piolho, com um velho amigo da primária – conheceu várias pessoas ligadas ao jornalismo, começando aqui a viagem de quatro décadas no Jornal de Notícias, em que ocupou cargos de estagiário, repórter informador, repórter, redator e chefe da redação e em que, ainda hoje, escreve.
Em 1956, ainda como escriturário no hospital e a trabalhar simultaneamente no Jornal, entrou para a secção administrativa, colaborando com a secção desportiva.
Mais tarde, e entretanto casado, propuseram-lhe um estágio de dois anos e, quando lhe ofereceram um horário das 22 horas às 4h para preencher o espaço das notícias de “Última Hora”, teve que sair do trabalho no hospital e ficar em exclusivo no JN.
Pode parecer para muitos um horário pouco agradável, no entanto, Germano confessa que gostou e que, depois de sair da redação de madrugada, ainda ia a vários cafés e restaurantes para tomar qualquer coisa e conversar.
Os anos a viver na “ilha” e o trabalho na fábrica de panos marcaram a sua juventude e o crescimento como pessoa e ser humano. “Valores como a solidariedade e a entreajuda aprendi-os lá”, confessa. Para o historiador, as pessoas nem sempre têm uma boa imagem das “ilhas”, mas Germano fala de uma “entreajuda” que nem sempre é possível ver-se noutros locais.
A sede pelas histórias do Porto nasceu no mundo do jornalismo. Aqui descobriu, inocentemente, que uma rua tinha muito mais do que um nome. Tinha uma história escondida. Um dia, nos princípios da carreira no JN, um incêndio na rua Firmeza abriu portas para um novo patamar daquilo que poderia ser uma notícia ou uma boa história. Naquele caso, apercebeu-se, com a ajuda do então chefe de redação, António Brochado, que a notícia não seria o pequeno incêndio num prédio, mas sim o passado que aquele preciso edifício tinha. A partir deste momento, foi embalado e inundado por uma onda de descobertas e de curiosidades sobre a cidade e as pessoas. Foi então o jornalismo que lhe abriu o caminho para a descoberta da cidade e da história, que já retratou em, pelo menos, nove livros publicados, nomeadamente, “À Descoberta do Porto”, “Porto: nos recantos do passado”, “Caminhar pelo Porto”, “Porto: sítios com história”, Porto: história e memórias”, “Porto: nos atalhos da história”, “Porto: uma cidade a descobrir”, “Porto da história e da lenda” e “Porto Desconhecido & Insólito”.Neste último, tentou ir buscar tudo aquilo que pensou saber e, que um dia, afinal, percebeu que havia muito mais para contar, muitas mais histórias para conhecer. Das pessoas que habitam na cidade, das ruas e ruelas escondidas e dos sorrisos ocultos atrás das janelas e paredes. Germano Silva faz parte da imagem da cidade e isso já não se pode negar. O seu jeito carinhoso e de contador de estórias “toca” a todos aqueles que se atravessam no seu caminho. O presidente do FC Porto, Pinto da Costa, afirmou em tempos que Germano tem o caráter típico de quem “gosta de partilhar o conhecimento, o que é também um traço das pessoas da nossa cidade”. Rui Rio atribuiu, em 2005, a Medalha da Cidade do Porto, ao escritor e jornalista.

O Porto batido de lés-a-lés por Germano
“Há duas hipóteses sobre o nascimento do Porto, mas a certeza que existe é de que esta cidade tem evoluído constantemente, através do rio e do comércio”, salienta o historiador.
Germano Silva conta que “os nossos mercadores eram pessoas com preocupações culturais, que se expandiram cultural e mentalmente” o que teve uma influência naquilo que é a cidade nos dias de hoje. Para o jornalista, “o Porto expandiu-se de uma maneira sólida, com uma população cada vez maior e também mais bem informada”.
O passar na rua e sentir o conforto do conhecido, do amável e do familiar é, para Germano Silva, o que de melhor tem a cidade e as suas gentes. “Dá sempre a sensação de que as pessoas me conhecem, mas na verdade não. Mas sinto-me acarinhado como em nenhum outro lugar”, confessa.
Quando questionado sobre qual a principal diferença entre o Porto e Lisboa, Germano Silva confessa que não entra nessa guerra. “Eu gosto de Lisboa, é luminosa e bonita, mas como é a capital, as pessoas vivem distanciadas. O Porto é mais intimista, há ajuda entre a população, é uma cidade onde as pessoas têm um sentido de solidariedade muito notável”, diz.
Aos domingos, Germano gosta de tirar fotografias pela cidade onde vai descobrindo ainda mais recantos e recebe provas desta tão famosa hospitalidade portuense. Para além desta forma de receber e de agraciar, o historiador fala também em características como a humildade e a resistência das gentes. “O Porto sempre foi uma cidade muito senhora do seu nariz, uma cidade que não se verga”.
Conhecida como uma cidade que não aceita grandes ociosidades e que nunca quis ser casa para fidalgos, Germano diz que o povo continua a mostrar essa característica de “bater o pé pela justiça e de reivindicar o que lhe pertence”.
Uma das histórias mais bonitas, para Germano Silva, que o Porto testemunhou e que faz parte do seu último livro “Porto Desconhecido & Insólito”, é uma história de duas raparigas, Henriqueta e Teresa, no século XIX. Henriqueta, que perdeu o pai muito cedo, era muito bonita, dava nas vistas e tinha uma vida muito agitada. Assim, atraía comerciantes ricos até sua casa, na rua Cimo de Vila, entretendo-os com a possibilidade de jogos sexuais enquanto lhes tirava relógios e outros objetos mais preciosos. Depois, punha-os na rua, sem nada ter acontecido. Eles, com vergonha, não se queixavam. Assim, aos poucos e poucos foi juntando algum dinheiro.
Entretanto, apareceu na sua vida uma rapariga, Teresa de Jesus, por quem se apaixonou. No entanto, o amor foi breve, uma vez que Teresa morreu, passado algum tempo, com tuberculose, tendo sido um golpe brutal para Henriqueta. Deste modo, para se lembrar sempre do seu amor, Henriqueta comprou um talhão para fazer um jazigo no cemitério do Repouso, onde mandou esculpir uma estátua de São Francisco de Assis. “É uma imagem muito bonita”, diz Germano. E a verdade é que esta história de amor ainda perdura. Ainda hoje há quem coloque flores ou terços nas mãos da estátua de São Francisco. “Há ali um culto qualquer e são histórias como esta de que se faz o Porto”, refere o historiador.

O que há ainda por descobrir
Além de conhecer esta cidade como ninguém, Germano não tem dúvidas de que há ainda muito mais por descobrir. “O Porto é uma cidade muito antiga, Portugal ainda não existia como país e o Porto ´já era gente`. Há sempre muito para descobrir sobre os nossos antepassados”, afirma o jornalista.
Para Germano, o Porto é uma cidade que está a ser constantemente descoberta. “É uma cidade com uma história muito interessante e rica que se afasta da História dos reis e que se aproxima da História da gente, das pessoas. E é essa a grande vantagem da cidade”, salienta.
Para os que nasceram na cidade e a querem conhecer melhor, Germano Silva propõe, em primeiro lugar, uma visita pelas ruelas que circundam a Sé e onde está o brasão da cidade com a designação de “Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto”. O jornalista frisa que foi nestas ruelas e ruas estreitas que as gentes bateram o pé ao Bispo, que ali “lutaram contra a opressão, pela liberdade” e que foi nessa zona onde se desenvolveram grandes valores humanos que ainda hoje correm nas veias dos portuenses.
As Ruas da Bainharia, dos Mercadores e dos Pelames são outros locais de visita obrigatória, porque foram através delas que se desenvolveu a cidade que pode ser vista e apreciada nos dias de hoje.
Para o historiador, os portuenses ainda não se embrenharam o suficiente na história da cidade e, por isso, não conseguiram ainda retirar todos os elementos e ensinamentos que esta tem a dar.
Sem estar alheio ao crescimento do turismo que se tem verificado, Germano diz que o turismo de hoje é diferente de outrora, de há 40 ou 50 anos. “Antes o turismo era apenas de ociosidade, as pessoas iam à praia e passeavam”, mas, nos dias que correm, os turistas procuram algo mais cultural, “são como os peregrinos da Idade Média, que andavam de lado em lado e paravam nas estalagens e hospedarias, trocando culturas, impressões e conhecimento”, explica Germano. Para o historiador, o Porto enquanto destino cultural tem muito para oferecer àqueles que vêm de fora, desde a Torre dos Clérigos até à famosa Livraria Lello.
Germano defende que a política que tem gerido a cidade foi sempre a de fomentar o turismo e a curiosidade sobre o que a compõe. Reconhece o grande desenvolvimento que a cidade tem conhecido durante os últimos quarenta anos e, principalmente, depois do início deste século, com a Capital da Cultura em 2001.
O jornalista confessa que se há 30 anos lhe dissessem que teria um telemóvel nas mãos, não acreditaria. Por isso recusa fazer qualquer previsão sobre o desenvolvimento do Porto ou sobre o futuro da cidade. “Não é fácil, para não dizer impossível, prever o futuro”.
O escritor destaca ainda a Universidade do Porto, instituição de grande reputação, que está em pé de igualdade com outras da Europa.
Germano acredita que hoje, com a globalização, “o Porto vai desenvolver-se a par da Europa, com a quebra das distâncias e das barreiras”.“O futuro é imprevisível, porque estamos numa constante evolução”, diz Germano. Salienta que a cidade tem de saber “olhar sempre para trás, para a História, e daí tirar os necessários ensinamentos”.

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