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Junta da Galiza

Bruna Costa

Bruna Costa

Neste mês de maio, a protagonista da VIVA! foi Bruna Costa. A jovem artista de 24 anos nasceu na Maia e é um dos talentos emergentes do Grande Porto, não só no mundo da música como na área da representação.

Em entrevista à VIVA!, Bruna Costa falou um bocadinho acerca do seu percurso, dando algumas perspetivas pessoais sobre a área e as expectativas que tem dentro da mesma.

(Nota: as fotografias foram tiradas no Castle Rock Pub & Hotel)

Começando pela base, a pergunta não é quando surgiu o teu gosto pela música, mas sim o momento em que percebeste que a tua paixão era algo bem mais profundo do que um hobby.

Falando do gosto de maneira geral, foi algo que eu sempre gostei de pequenina. Os meus pais sempre gostaram e eu segui as pisadas. Eu fazia teatro na escola e dançava desde pequenina, portanto o meio artístico sempre me interessou dessa forma, apesar de nunca ter percebido que era uma possibilidade de trabalho. Eu fiz um workshop de teatro musical com 13 ou 14 anos e percebi que realmente era giro juntar todas as áreas que eu gosto. Hoje em dia, já não danço tanto, mas depois do workshop, comecei a ter aulas de teatro musical e decidi que ia estudar profissionalmente. Por isso, as duas áreas andaram sempre de mãos dadas. Comecei a dar concertos aos 14 anos, fez há alguns dias 10 anos do meu primeiro concerto. Foi numa de tocar para amigos, num café na Maia. Eu disse que podia ser, até porque já metia umas coisas no Youtube. Depois, fui ao The Voice e aí foi o clique de que, de facto, queria mesmo seguir a vida artística.

Como foi a experiência no The Voice?

Foi boa, considerando que estava a começar, tinha 15 anos, fui lá a ver no que é que dava. Nem fui eu que me inscrevi, inscreveram-me. Achava que ninguém me ia chamar, que nem ia passar o pré-casting. Acabou por correr bem, passei a prova cega e fiquei com a Áurea. Em termos de experiência, foi muito bom ter uma espécie de aceitação de quatro pessoas que são referências nacionais, independentemente do estilo. Foi ótimo porque a Áurea sempre me deu aquela palmadinha nas costas de que só tenho 15 anos, tenho tudo pela frente e estou no bom caminho. Não deixa de ser televisão e também tem algumas coisas menos positivas e já limpei um bocadinho disso, pelo que só tenho as coisas positivas comigo.

Muitos dos artistas nos programas não continuam depois dos programas de TV?

Eu sinto que há um problema, mas também é um problema do público. Ou seja, focam-se muito em coisas à parte do nosso percurso como cantores. Há sempre aquilo das histórias de vida, mas isso sempre me fez muita confusão. Eu fui para lá para cantar e para aprender mais, não para contar histórias. O público consome isso, o que faz com que os programas deem mais atenção a isso do que ao lado artístico. Uma coisa, por vezes, compensa a outra, mas em muitos casos eu acho que não. Depois, é um tipo de trabalho que tem de ser feito pelas pessoas que participam. Há muita gente que acha que vai lá e pensa logo que vai tocar nas rádios, dar concertos e ir aos festivais. Não funciona assim, mesmo artistas que trabalham há muitos anos têm de apresentar coisas novas e continuar. Eu acho que os programas acabam por ser ilusórios nesse sentido, pois muita gente acha que é isso que vai despertar a tua carreira. Até podes ter muitos milhões de visualizações no YouTube, que só os que trabalham mesmo é que poderão continuar na área. Muitas vezes, há quem não chegue longe nos programas e que continua e acabam por conseguir. No meu caso, ainda não estou em grandes palcos, mas vivo da música. Acho que falta essa consciência em quem participa.

Dá-te a ideia que, por vezes, mais parece que o músico é também um influencer?

Eu sinto isso. Obviamente que a Internet trouxe coisas incríveis, mas trouxe uma pressão muito grande na nossa área, em particular. Parece que és obrigado a estar constantemente ativo e a mostrar que estás a trabalhar. Isso cria uma grande comparação entre artistas. Por exemplo, se este tem X seguidores e eu tenho menos, então parece que estou a fazer as coisas pior. Podes ser só uma pessoa que não gosta de expor a vida. As redes sociais são uma ferramenta muito fixe, mas confesso que sou distraída e não publico tanto quanto deveria. Ainda que isso seja relativo, dado que o meu trabalho é o que faço no palco e em casa a compor. É claro que é bom porque chego a muito mais gente. Ponho um vídeo e pode chegar a muito mais pessoas. No entanto, esta competitividade tornou a área um bocadinho menos humana. A arte depende das pessoas e as redes criam uma ideia de sucesso ou insucesso e o pessoal está tão focado em ter likes, views e já só fazem coisas para isso, não porque têm uma mensagem a passar. Não acho que os artistas devam ser influencers, mas acho que estamos nessa era.

Do cantar, ao produzir, ao escrever, o que é que te dá mais prazer de fazer agora e em que é que gostavas de investir mais no futuro?

Eu adoro escrever, desde miúdo adorava fazer isso. No entanto, tenho alguma dificuldade em fazê-lo para música. Sinto que nunca era bem isto, quando quero passar para música. Acho que vem com o tempo e com a maturidade. Ultimamente tenho-me sentido mais capaz e às vezes é só deixar fluir. O que eu mais gosto é mesmo estar em cima do palco, a interação com as pessoas, principalmente quando toco coisas minhas. É importante para me dar a conhecer e libertar-me desse medo de mostrar aquilo que é meu. Adorava tirar um curso de produção musical, é uma parte que domino menos. A nível de composição, como sou autodidata, gostava de ir aprofundando com o tempo. Fui tendo umas luzes de produção de forma autodidata também, a pandemia ajudou por ter mais tempo livre. Gostava de desenvolver mais ferramentas nesse aspeto e, mesmo ao nível do canto, gostava de um dia poder dar aulas. A ideia é mesmo trabalhar isso para me complementar e trabalhar de forma mais independente.

Muita gente te conhece de te ver a tocar na rua. O que aprendes na rua que não aprendes noutros palcos?

Paciência. Há muita gente que acha que é fácil. Que é só aparecer, ligar as coisas e tocar. A cidade também não tem ajudado muito nesse sentido. Quando comecei, em 2020, como éramos poucos, as coisas eram simples, apesar das restrições por causa do Covid. Com o tempo, foi passando e geria-se bem as coisas, desde horários ao sítio onde tocávamos. Sempre foi um sistema de boca a boca. A paciência, a partir do momento em que a pandemia acabou, trouxe muita malta que chegou sem consciência do outro e que só queria tocar num sítio, a uma determinada hora, naquele lugar o tempo que me apetecer. Apesar de não haver nada escrito, havia sempre aquele respeito para todos terem o seu tempo e espaço dentro da cidade. A partir do momento em que começou a haver mais movimento, isso parece proveitoso para nós mas não é. Quando há muita confusão, as pessoas só querem circular. Quando estão menos, ainda param mais um bocadinho e ficam a apreciar. Por isso, aprendi a ter paciência, também no sentido de ter pessoal que se vem meter contigo ou pedir coisas. Alguns mexem nas caixas, fazem queixa à polícia porque naquele dia lhes apeteceu. Já vi muitos colegas a serem parados por coisas que não fizeram. É um jogo constante em que tu queres tocar e estar tranquila, mas nem sempre dá. A rua deu-me mais estaleca para lidar com pessoas, saber chamar a atenção de certo público, perceber que música funciona e qual é que não funciona. Para além disso, também o à vontade. Em termos de treino vocal e guitarra, foi também uma grande escola.

Achas que ainda há preconceito com músicos de rua?

Completamente. Quando comecei a tocar na rua, inclusive pessoas próximas de mim foram dizer à minha mãe que não tinha jeito nenhum eu estar na rua. Mas qual é o problema? Porque há este estigma de que quem toca na rua está a pedir. Há também o estigma de que quem toca na rua está a pedir para comprar determinadas substâncias, o que não é verdade de todo. Obviamente que há um ou outro que o possa fazer, mas cada um sabe de si. Eu acho que as pessoas que dizem isso, se calhar nunca se deram ao trabalho de passar na rua e perceber que é um trabalho como qualquer outro, simplesmente não temos horário fixo, por isso é um bocadinho nómada. Eu carrego o meu material, paro num sítio, toco as minhas coisas, recebo o dinheiro e vou para casa. Há muito essa coisa de “ai, coitadinha, está na rua, está a passar mal”. No meu caso, não fui tocar para a rua por necessidade extrema monetária, mas sim porque a pandemia começou e os sítios onde eu tocava e o teatro onde eu trabalhava fecharam. Eu pensei: o que faço agora? Eu posso estar em casa a tocar, mas não estou a receber por isso. Quando as coisas começaram a acalmar um bocadinho, eu comecei a ir para a rua. Entretanto, passaram-se quatro anos e eu já não vou há muito tempo, porque os sítios onde costumava ir voltaram a abrir. Depois, também abriram coisas novas. Voltei a trabalhar em teatro, por isso o tempo começou a ser gerido de outra forma, pelo que já tenho outro meio de sustento. 

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Dirias que isso acontece por ser em Portugal?

Sim, em Dublin então é uma coisa absurda. Há pessoas que vão à Irlanda só para ver os músicos de rua. Em Barcelona, isso está a começar a acontecer, em Madrid. São coisas mais legisladas, por isso correm melhor do que aqui. Mas o problema em Portugal não é só com os músicos de rua, é com os artistas em geral. Há uma descridibilização muito grande, eu lembro-me de ter professores a perguntarem-me sempre se tinha a certeza que queria estudar teatro. Diziam que não era um curso e, passado um ano, encontrei alguns professores que me perguntavam como é que as coisas estavam “lá no sítio”. Eu dizia-lhes que era uma escola, na mesma. É um trabalho, mas as pessoas acham que não, pensam que é um hobby. Já aconteceu estar a preencher uma papelada e perguntarem-me a profissão: eu disse que sou música e atriz. Voltaram a perguntar-me a profissão. Eu disse que sou artista e voltaram a perguntar a profissão. Perguntaram-me se podiam pôr empresária. De um modo geral, sente-se muito esse preconceito de que os músicos gostam é de beber copos, estar com os amigos à noite e tocar umas coisas. Não é isso, é um trabalho. Acontece com o teatro e outras áreas artísticas. Na rua ainda és mais sobrecarregada com isso já que, para além de ser arte, estás encostada a um canto a pedir uns trocos a quem passa. Eu não tinha noção até tocar. Lembro-me de ser miúda e ver o pessoal a tocar na rua, eu sentia “ei, eu também quero”. Quando me deparei com esse preconceito, foi muito estranho. Não me faz sentido nenhum.

Entre a representação e a música, quais são as grandes diferenças a preparar os dois tipos de atuações?

É muito diferente porque tudo o que faço em teatro é coletivo. Tirando quando toco com banda, sou eu sozinha e não tenho uma persona para preparar. É tudo mais tranquilo, ainda que haja uma ou outra atuação que me deixam mais tensa. No entanto, como já tenho algum tempo disto, já vou tranquila. Portanto, é mais uma preparação minha muito técnica. É ver se tenho tudo no sítio, beber água e já está. No teatro, não é bem assim. Os nervos são muito piores. Quando estou sozinha, não há problema porque se correr mal, sou só eu. No teatro, se faço asneira, nota-se claramente e uma equipa inteira vai ficar sem saber como reagir. A preparação aí é mais de concentração, tanto sozinha como em grupo. Eu estou um ou dois meses em ensaio para isso. Nos concertos, praticamente não ensaio. Os ensaios são os concertos. É muito diferente.

Se alguma área explodisse cada vez mais, abdicavas de algum?

Eu acho que não. Ia sempre tentar conciliar, por mais que um tivesse crescido repentinamente. Há um peso maior para a música, mas ao mesmo tempo eu não consigo deixar de fazer teatro ou de estar incluída de alguma maneira. Há muitas formas de o fazer. Fazendo de conta que cresço muito na música, se calhar vou querer estar metida do lado de fora. A dirigir ou a acompanhar algum processo. O contrário seria igual. Se crescesse muito como atriz, ia sempre querer cantar na mesma. Quanto mais não fosse, fazia musicais e ia tudo junto.

O que te dá mais gosto em atuar no Porto?

Tenho sentido que nos bares, no Porto, o público é cada vez menos portuense. Tem a ver com os sítios onde eu toco que são pubs e atraem mais esse tipo de pessoas. No entanto, claro que há uma massa de pessoas que são daqui e que dão um calor diferente, eu sinto isso. Já toquei na rua em Lisboa e senti que a reação é completamente diferente. Não dos turistas, mas sim dos portugueses. Eu senti que nem olhavam, não sei se têm mais malta lá ou não, mas senti mais indiferença. Se calhar, lá o ritmo é mais frenético, não sei. O pessoal do Porto já olhou para o rio Douro dezenas de vezes mas vai olhar sempre mais uma porque é o nosso rio, a nossa ponte e é bonito. Sinto que já tenho um público regular de pessoas que me viram 3 ou 4 vezes e já me dão um grande abraço. Parece que me conhecem há 4 ou 5 anos. No entanto, acho que há maior proximidade aqui, se gostamos e queremos dar um abraço, fazemos isso.

Quais são os hobbies?

Sou muito óbvia: ler, ouvir música, ver filmes, séries e tocar instrumentos. Ainda que isso seja o meu trabalho e não um hobby. Adoro desenhar e gosto muito de cozinhar.

O que é que tu fazes que mais irrita os outros?

Eu acho que o que eu faço que mais irrita é ser muito teimosa. Quando tenho uma ideia é aquilo e ninguém me demove.

O que é que os outros fazem que mais te irrita?

Irrito-me muito com pessoas que se acham mais do que os outros. Irrito-me muito com pessoas preconceituosas e acho que vou ficar por estes dois. 

Tens toda a carreira pela frente, mas o que é que mais te orgulha e o que falta fazer para a frente?

O que mais me orgulha é o facto de nunca ter desistido. Não é que tenha tido grandes obstáculos, mas no sentido literal de ter pessoas a dizerem-me “não vás” e eu fui. Ter pessoas a dizer “olha, que este meio é complicado, podes não conseguir trabalhar” e ir na mesma. Até hoje, acabei o curso em 2019 e não parei de trabalhar nas duas áreas. Orgulho-me disso, de ter o mindset de continuar sempre. Num espaço de meio ano, queria gravar um disco e lançar. Mais para a frente, gravar mais discos e gostava de pisar alguns palcos icónicos. Um Altice ou algo do género. Se calhar nem me vejo aí, se calhar até prefiro festivais mais pequeninos, não tão comerciais. Mas essencialmente é isso: gravar um disco, ter a banda comigo e fazer uma tour. Depois, repetir várias vezes a fórmula.

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