Nasceu há pouco mais de um ano com a missão de preservar o “espírito” e a “autenticidade” das tradicionais tabernas do Porto e não pretende abrir mão desta luta pela defesa da cultura popular. O Grupo dos Amigos das Adegas e Tascos do Porto (GAATP) foi criado por iniciativa do antigo jornalista Manuel Vitorino, que decidiu desafiar alguns portuenses (nomeadamente o investigador Hélder Pacheco, Raúl Simões Pinto, que publicou um livro sobre estes espaços ligados à alma da Invicta, o economista José Oliveira e Manuel Valdrez, entusiasta do associativismo) a lutarem, juntos, contra a extinção daqueles que consideram ser os locais mais castiços da cidade.
Em declarações à Viva, Hélder Pacheco afirmou tratar-se de um grupo “esforçado mas desportivo”. “Considerámos, desde o início, que não deveríamos estar sujeitos a um espírito de organização formal e burocrática e, por isso, abolimos as quotas”, afirmou, realçando que esta é uma característica importante “no momento em que vivemos”. Todos os meses, os “Amigos” escolhem um tasco que mantenha o caráter original e juntam-se à mesa com o duplo objetivo de homenagear uma determinada figura da cidade e de apoiar, simultaneamente, os negócios locais. “Procuramos que os jantares sejam acessíveis até porque não fazia sentido que o Grupo dos Amigos das Adegas e Tascos do Porto andasse em restaurantes caros”, notou o investigador, reconhecendo, ainda assim, que “as verdadeiras tabernas, as de tradição, são muito pequenas”, o que acaba por inviabilizar a realização de encontros que envolvam um maior número de participantes.
Carlos Tê foi o último homenageado
O último jantar de reconhecimento, dedicado ao letrista Carlos Tê, foi realizado, recentemente, na Adega da Cantareira, com a participação de cerca de 40 pessoas. E como o grupo procura preservar a tradição também nos menus escolhidos, a sessão de homenagem fez-se acompanhar de sardinhas assadas e pimentos. “Vamos conciliando a cultura portuense das velhas tabernas com o mínimo de perda de autenticidade dos lugares que escolhemos”, referiu, lamentando que os verdadeiros tascos sejam um espaço cultural “em vias de extinção”. “A sociedade estava cultural e socialmente estratificada assim: o povo, sobretudo a classe operária, que era um terço da população do Porto, convivia nas tabernas ou nos tascos; a média burguesia convivia nos cafés e a grande burguesia nas confeitarias e nos salões de chá”, sublinhou Hélder Pacheco, adiantando que, de acordo com uma investigação que está, neste momento, a desenvolver, em 1924 havia cerca de 1300 tabernas na cidade Invicta, sendo que, atualmente, “as autênticas” não são mais de uma dezena.
Entre os homenageados do grupo estão também o centenário Clube Fenianos Portuenses (que apoiou o lançamento do GAATP, cendendo-lhe as instalações para alguns encontros), Bê Veludo e João Manuel (ligados ao programa mais antigo da rádio portuguesa, “A Voz dos Ridículos”) e ainda Maria de Lurdes dos Anjos, “profundamente ligada às culturas populares do Bonfim”. As próximas figuras em destaque permanecem no ‘segredo dos deuses’, pelo menos até a direção do Grupo dos Amigos das Adegas e Tascos do Porto avaliar as hipóteses que estão ‘em cima da mesa’. “Felizmente ainda há gente que se dedica a fazer uma espécie de intervenção cívica em benefício dos outros e é esse caráter que nós queremos destacar”, realçou o cronista.
Grupo prepara-se para distinguir “Tabernas de Tradição”
Hélder Pacheco adiantou ainda que a coletividade vai começar, em breve, a atribuir a distinção de “Taberna de Tradição”, mediante uma seleção assente em critérios de qualidade e autenticidade, com a colocação de um símbolo “para que as pessoas saibam que aquele local corresponde a uma tradição portuense”. “Gostaríamos que a Câmara do Porto se associasse a este acontecimento, mas ainda não sabemos se será possível. No caso de não conseguirmos colocar a placa no exterior, como gostaríamos, vamos colocá-la no interior, que aí já não é preciso licenciamento”, avançou, reconhecendo que, na sua opinião, o mais belo tasco portuense é a Adega S. Martinho, na Rua D. João IV, onde, todavia, não há espaço para mais de dez pessoas. “Esse é um dos nossos objetivos: tentar travar o desaparecimento das tabernas que ainda restam”, concluiu.
Texto: Mariana Albuquerque | Fotos: GAATP