Numa altura em que grande parte dos casais portugueses foram postos à prova, num confinamento inusitado, e que não estava, de todo, previsto no seu quotidiano, a VIVA! pediu ao famoso psiquiatra e sexólogo portuense, Júlio Machado Vaz, a sua opinião em relação à forma como as relações – alvo de um conjunto de desafios extremamente complexos durante este período – poderão ter sido, ou virão a ser, afetadas pela pandemia de covid-19, dado que os casais estiveram juntos 24 sobre 24 horas, alguns com um ou mais filhos para cuidar e tendo de enfrentar o (novo) regime de teletrabalho e ainda as tarefas domésticas.
Assim foi a realidade de muitos casais nos últimos três meses, num desafio que, segundo Júlio Machado Vaz, teve um peso maior para as mulheres, pelo seu habitual estatuto de cuidadoras do equilíbrio familiar. O país enfrentou aquela que pode ter sido a grande prova de superação para a maior parte dos casais e, nesse sentido, o teletrabalho foi talvez o melhor exemplo. Pela dificuldade em separar vida profissional e familiar e manter horários adequados, partilhar espaços por vezes exíguos e apoiar as crianças no seu crescimento ou atividades escolares.
Sobre de que forma as relações poderão ter sido ou poderão vir a ser afetadas pelo novo coronavírus, Júlio Machado Vaz considera que em geral, o melhor preditor do que acontecerá é o estado anterior da relação – se era boa tem melhores hipóteses de sobreviver sem grandes sobressaltos, se já havia fissuras elas podem agravar-se. Mas, adianta, todas as generalizações são perigosas, uma vez que já observou casais que estavam a caminho da separação e que a gravidade de situação os voltou a aproximar.
De qualquer forma, adverte que o confinamento é uma experiência stressante a nível individual ou de casal, motivo pelo qual já começou a ter também uma mistura de reações em geral autolimitadas e mais do que justificadas na saúde mental dos portugueses, nomeadamente ansiedade, medo, distúrbios de sono, tristeza e preocupação. Além disso, considera, poderão estar a dar-se também os primeiros sinais de outras [reações] que se consolidarão ao longo dos próximos meses – burnout na população em geral e nos profissionais de saúde em particular, quadros depressivos e casos de stress pós-traumático.
Para colmatar este tipo de reações, o psiquiatra e sexólogo aconselha a que os cidadãos se cuidem tanto ao nível físico como psíquico, adotando, para o efeito, medidas simples como praticar exercício, manter rotinas e aproveitar todas as oportunidades tecnológicas e presenciais para reforçar os laços sociais.
Exigir a quem de direito as respostas adequadas ao nível de valências de apoio psicológico e do fácil acesso a elas é também uma das recomendações de Júlio Machado Vaz, que caracteriza esta pandemia como a situação-limite que os especialistas previam há muito tempo, uma doença global numa sociedade global. Mas atenção!, afirma, o vírus é democrático, mas as sociedades por onde se passeia não e por isso já temos dados mais do que suficientes para dizer que, como de costume!, os mais desfavorecidos pagam o preço mais alto.