
Como se tornou uma fã tão apaixonada do FC Porto?
Não sei dizer. Desde que me lembro que sou do FC Porto, apesar de na altura ser uma raridade, entre os miúdos da minha idade, em Lisboa. O meu pai também é portista. Poderia dizer que foi influência dele, mas eu era sempre do contra por isso até é estranho não ter sido do Sporting, ou assim. A verdade é que há uma recordação familiar incrível que é o meu pai, louco, a festejar um golo do Jardel ao Milão. Acho que ver uma pessoa, habitualmente circunspecta, a correr pela sala a celebrar, me fez querer vibrar da mesma maneira com golos do Porto.
Como é para uma portista viver lado a lado, em Lisboa, com benfiquistas… e sportinguistas?
Quando o Porto ganha, é maravilhoso, quando perde, é muito enervante. Mas até agora tive mais anos bons do que maus, tem sido bom tê-los aqui à mão de semear. Eu gosto muito da picardia com os rivais, acho que isso é que dá graça ao futebol. É também por isso que não vibro muito com a seleção nacional. Porque mesmo quando ganhamos a França, não tenho franceses com quem gozar no dia seguinte.
Ser humorista interfere no seu dia a dia familiar? Faz piadas em casa com o seu marido, por hábito ou para praticar?
Não faço piadas para praticar, porque não vejo isso como trabalho. Faço sempre que me ocorrem, tal como já acontecia antes de fazer disso profissão. Podemos chamar-lhe, portanto, um hábito. E acho que não é um mau hábito. Jogamos uma espécie de ping pong, a ver quem consegue ter mais graça. Mas não é sempre, se não era uma canseira. Conseguimos ser pessoas normais no resto do tempo.
Como surgiu a ideia e o convite para o programa “Altos & Baixos”?
Já trabalhava no Canal Q, como guionista de outros programas, e estava prevista a estreia de um novo programa do Nuno Markl. Esse programa acabou por se atrasar, e pediram-me, a mim e ao Daniel, que fizéssemos um, durante quatro semanas, para “encher” a grelha enquanto não estreava o do Markl. Acabou por durar um bocadinho mais do que quatro semanas. Uns três anos… Foi um feliz acaso.
Contava com todo este feedback do público e sucesso imediato do programa?
Não, não contava com nada. Contava simplesmente que ao fim de quatro semanas o programa terminasse e eu deixasse de ter aquela “chatice” de gravar à noite, a meio da semana. Não diria que o sucesso foi imediato. A verdade é que as audiências foram boas, o que levou o Canal a continuar a apostar no programa, e depois sim, esse feedback foi crescendo, e as pessoas começaram a interagir muito connosco, enviando sugestões, pedindo para assistir à gravação, etc, culminando nos espetáculos que fizemos e que esgotaram rapidamente, para nossa grande alegria.
Aliás, vocês já sairam do estúdio. E já passaram por cá também. Como foi a experiência?
Foi fantástica. Adorámos a noite em que atuámos no Sá da Bandeira e esperamos voltar em breve com um novo espetáculo.
No “Altos & Baixos” houve certamente histórias (e personagens) caricatas: alguma especial que destaca? Porquê?
Destaco o Xerife Penas, talvez. Uma figura do norte do país, curiosamente, que começou por enviar-nos um mail muito desagradado, por lhe termos chamado “Hernani de Carvalho de trazer por casa” (percebo, também me ofenderia), mas depois nós respondemos, explicando o intuito do programa, e ele reagiu muito bem, pedindo até, no seu Facebook, que as pessoas não nos insultassem! Anos mais tarde, convidámo-lo a participar no espetáculo e ele acedeu.
Considera que há espaço para o “Altos & Baixos” numa tv generalista?
É difícil, porque é um programa que levanta dois tipos de problema: por um lado, a utilização de imagens de outros canais e, por outro, a sensibilidade dos visados. Se já no Canal Q tivemos alguns problemas com gente que se sentiu ofendida, num canal com maior exposição isso iria acontecer a toda a hora.
E o percurso na Antena 3. Como o resume? +/- 2 minutos, manhãs, as Donas da Casa fazem parte da sua telefonia… Há algum programa especial?
O percurso na Antena 3 surgiu, tal como tudo o resto, sem eu estar à espera. Fiz um workshop de rádio com o Diogo Beja que, pouco tempo depois, me convidou para fazer parte do programa da manhã. Foram anos muito divertidos, apesar da dor de acordar às seis da manhã. Hoje em dia tenho um horário bem mais simpático (das 13h às 16h) e uma colega que me tem ensinado muita coisa, a Ana Galvão.
Que características é que um bom humorista deve ter, a seu ver?
Não se levar muito a sério. Diria que este é o principal requisito. Estranhamente (ou não) muitas vezes são os humoristas quem tem menos sentido de humor e poder de encaixe. Depois, acho que ter uma espécie de lupa para observar o que nos rodeia é muito útil, porque aumenta as coisas, expondo o ridículo que há em cada uma delas.
O humor também apresenta dissabores. Há temas mais delicados de abordar?
Há temas aos quais não acho graça e que por isso não abordo. Cada um tem a sua sensibilidade e impõe o seu próprio limite. Pessoas em situações muito dramáticas, para mim, não são apetecíveis enquanto alvos de piada.
Quais as suas mais traumatizantes experiências da sua profissão e quais as mais positivas?
Experiência traumatizante acho que não tive, felizmente, nenhuma. Talvez o aborrecimento de ter de ir a tribunal ou ficar com termo de identidade e residência (!!) por causa de um programa de televisão, mas nada de grave. É só mais uma história para contar. A experiência mais positiva é sempre que se faz uma piada que cumpre o seu objetivo: provocar riso.
O que recorda com mais prazer e o que deseja esquecer?
Desejo lembrar-me de tudo, até dos trabalhos que correram mal, para não repetir os mesmos erros. A experiência que recordo com mais prazer é mesmo o “Altos & Baixos” ao vivo, as duas noites que fizemos, porque é diferente ter reação imediata ao que dizemos, coisa que não acontece na rádio ou televisão.
Uma humorista chora?
Quando está grávida chora com tudo. Até com o hino nacional (história verdadeira). No resto do tempo, choro mais a rir. Mas não estou sempre contente, nada disso. Tenho exatamente as mesmas variações de humor que as outras pessoas (ou, talvez, pior!).
Os reality shows são um bom “partner” para o humor? Assume-se, aliás, como viciada em reality shows. Qual para si tem mais “pérolas”?
Na verdade já me cansei – e acho que toda a gente – dos reality shows que temos. Mas tiveram uma época de ouro, sem dúvida, no que toca à riqueza de personagens: do Zé Maria à Fanny, passando pelo Marco, Cátia Palhinha, etc, há assim umas quantas que entraram diretamente para o panteão dos cromos.
Como avalia o atual panorama da tv portuguesa?
Nas generalistas não dá para fugir muito do mesmo. Não tenho paciência nenhuma para talent shows, nunca gostei e não percebo como é que um país tão pequeno tem tantas edições desses programas. Parece que continuamos a escavar à procura de petróleo. Para novelas também não tenho paciência. Durante o dia, temos os famosos programas de day time e, nesse capítulo, sou uma confessa fã do Manuel Luís Goucha. Antigamente as pessoas achavam que eu dizia isto a gozar mas acho que hoje já percebem que é a sério, e se assistirem com atenção durante alguns minutos, percebem que não temos em Portugal quem faça televisão melhor que ele. Nos quatro canais, o programa que mais me tem prendido a atenção é o “Pesadelo na Cozinha”, um caso em que a adaptação de um formato estrangeiro supera largamente o original. De resto, vejo de tudo um pouco. Sempre tive um critério pouco apertado, vejo imensa televisão.
Acha Portugal um país triste? Se sim, porquê?
Não. Acho Portugal um país um bocadinho nostálgico e saudosista mas não triste. Enchemo-nos de contentamento com as nossas vitórias, por exemplo. Seja no Euro ou no festival da canção. Acho Portugal um país orgulhoso.
Qual o papel do humor no dia a dia das pessoas? E no ânimo do país?
No meu dia a dia, o humor tem papel preponderante. É quase mais um idioma. Falo português, inglês e humor. E arranho francês (na verdade não arranho nada, sei dizer “je m’appelle” e pouco mais). E acredito que para os restantes portugueses essa linguagem também seja importante, porque é muito usada, tanto pelo senhor que nos atende no café como pelo político que vai à televisão e tenta fazer uma gracinha. Vemos, aliás, nas redes sociais, que hoje temos quase 10 milhões de humoristas, e isso é bom.
Atua mais em programas de tv do que em stand up. De qual gosta mais?
Na verdade não faço stand up. A única exceção que abri – porque era impossível dizer que não – foi para a gala dos Dragões de Ouro na qual, de facto, estive de pé, num palco, a dizer coisas parvas, pelo que talvez possamos chamar-lhe stand up. De resto, tenho aquela espécie de stand up a dois com o Daniel, que é mais confortável que o stand up porque há alguém com quem contracenar, e gosto muito. É mais divertido do que estar num estúdio a falar para uma câmara e a imaginar pessoas do lado de lá.
Como descreve o seu dia a dia, atualmente?
Cansativo! Antigamente tinha dois trabalhos, o da rádio e o da televisão, às vezes três, com espetáculos ou eventos para empresas, agora tenho quatro, porque tenho um filho de cinco meses que não me concede folgas. Diria que a minha especialidade, nos últimos tempos, deixou de ser escrever piadas, e passou a ser lavar biberões e fazer sopa. Estamos sempre a aprender.
É reconhecida na rua? Como reage?
Acontece com alguma regularidade. Sobretudo se estiver com o Daniel, que dá mais nas vistas. As pessoas ficam muito surpreendidas de nos ver juntos, porque normalmente os apresentadores não andam por aí aos pares (e não casam uns com os outros, nem têm filhos). As pessoas são sempre muito simpáticas, quem quer ser antipático só consegue fazê-lo na internet.