
O presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, criticou o acordo sobre descentralização assumido entre Governo e Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), que toma as autarquias por “serviços de manutenção local do Estado”.
Numa carta enviada segunda-feira ao secretário-geral da ANMP, Rui Solheiro, Eduardo Vítor Rodrigues considera que “Os municípios poderão fazer melhor do que o Estado Central nas tarefas propostas, mas pedia-se muito mais e, sobretudo, um modelo de descentralização que emancipasse progressivamente as câmaras, em vez de as tomar por ‘serviços de manutenção local’ do Estado”.
O também presidente do Conselho Metropolitano do Porto critica ainda a “substituição da descentralização por uma mera ‘tarefaização’ da intervenção, ainda somada a uma clara ausência de rigor nos dados e ausência de ambição nos valores em questão”.
“Entristece, finalmente, que um qualquer calendário esteja a precipitar uma urgência no processo, que não compensa o arrastamento do mesmo ao longo de muito tempo e que poderá ser um presente envenenado para o poder local”, destaca o autarca.
No documento, a que a agência Lusa teve acesso, o autarca ironiza o trabalho feito em torno do acordo pela descentralização e dá os “parabéns” ao Governo “pela negociação política obtida”, também “à oposição parceira deste processo (PSD), por participar no que (só) parece ser uma efetiva reforma estrutural” e também à própria ANMP “pela ilusão da descentralização”.
“Só não estarão de parabéns os municípios, a esses o tempo dirá que foi uma oportunidade histórica perdida: muita tarefa, muita burocracia, muito ‘excel’, mas pouca política, nenhuma estratégia, pouca participação no desenvolvimento local”, lamenta o autarca gaiense.
Para Eduardo Vítor Rodrigues, é “delirante conceder aos municípios, por igual, três dias para se pronunciarem sobre dados que, antes de analisar, importa validar”, realçando que, no caso de Gaia, “os mesmos não estão corretos e necessitam de reconfirmação/atualização”.
Segundo a agência Lusa, o autarca de Gaia fala em verbas “inscritas no ‘excel'” que são “alheadas da realidade”, “informação ainda mais vaga ou opaca” na saúde”, critica que, nos centros de saúde, sejam os municípios a “ter tradição na pintura de uma parede e na assunção do (escasso) pessoal operacional, sem correspondente responsabilidade de gestão”, e considera “confuso” o quadro relativo ao pré-escolar e 1.º ciclo.
Sobre finanças locais, o presidente da Câmara de Gaia diz que “a ANMP cai num grande logro, o da transmissão de uma imagem errada dos valores em questão”.
“Mais do que dizer que receberemos 7,5% do IVA, que cria uma expectativa e representação social de rápido ‘enriquecimento’ dos municípios (que muito lhes vai custar, o tempo o dirá), importa dizer que isso significa valores ridículos. Pena que as grelhas do ‘excel’ enviado não concretizem isso, para podermos demostrar o logro”, realça.
Vítor Rodrigues diz ainda que “vai custar muito aos municípios explicar às pessoas que, afinal, as verbas são irrisórias e a mensagem transmitida era, no mínimo, equivocada, com a cumplicidade da ANMP, com consequências nas dificuldades de intervenção nos problemas”.
De recordar que no sábado, o presidente da Câmara do Porto disse que vai levar dia 24 à reunião do executivo camarário uma proposta de saída do município da ANMP por considerar “inaceitável” o acordo fechado com o Governo sobre descentralização.
A ANMP encerrou a 3 de julho o processo negocial com o Governo sobre descentralização e finanças locais e garantiu um aumento de dois a 10% das verbas a transferir para as autarquias.
O acordo fechado vai permitir às autarquias recuperarem 200 milhões de euros nas transferências do Orçamento do Estado e ter 75 milhões de nova receita, no âmbito do IVA.
De referir que a Área Metropolitana do Porto (AMP) vai reunir-se na quarta-feira para discutir este acordo.