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“É para levar a sério”: diz Hélder Pacheco, sobre o futuro da casa de Almeida Garrett

Nas últimas horas, um dos temas de ordem da cidade do Porto tem sido o pedido de expropriação da antiga casa de Almeida Garrett. Este domingo, dia 8 de dezembro, houve uma manifestação contra a transformação do edifício num futuro hotel.

Nesse sentido, a VIVA! esteve à conversa com o historiador Hélder Pacheco, que explicou, de forma aprofundada, o ponto de situação acerca da residência histórica de uma figura incontornável da cultura portuense e portuguesa.

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Como analisa a recente tentativa de impedimento da transformação da Casa de Almeida Garrett num novo hotel?

Na Rua do Calvário, nasceu Almeida Garrett. É, na minha opinião e de muita gente, o maior vulto da cultura portuense e, provavelmente, o maior vulto da cultura portuguesa. Ele viveu lá até aos 5 anos, depois viveu em Gaia com um tio, mas o que é certo é que nasceu naquela casa e lá permaneceu nos primeiros anos de vida. No final do século XIX, a Câmara do Porto homenageou, colocando um grande medalhão que ainda lá está, felizmente. Durante muitos anos, teve no rés do chão uma mercearia. A mercearia é um comércio digno, mas não é propriamente a maneira de dignificar o maior vulto da cultura portuguesa. Arrasta-se há mais de um século a grande homenagem a Garrett, que era a casa ser adquirida e transformada, tal como foi em Paris a casa de Victor Hugo. É uma casa de celebração de grandes personalidades, sendo que acontece em toda a Europa. A casa ardeu não se sabe como e neste momento só tem fachada. O que acontece é que, segundo consta, está provada a intenção de instalação de mais um hotel. Instalar um hotel na casa de Garrett é adiar a grande homenagem que a cidade deve ao Garrett. Na minha opinião, a classe política tem de levar isto a sério, já que com estas coisas não se brinca. Acho que há certa propriedade privada que tem um valor tão importante do ponto de vista nacional, que não há que haver contemplações. É fazer uma avaliação justa e expropriar. Tornar aquilo num centro de documentação e de divulgação da personalidade de Almeida Garrett e do próprio liberalismo. Para além de ser uma grande figura da nossa literatura, Garrett fundou o teatro nacional, o conservatório de Lisboa, as academias de artes de Porto e Lisboa, acompanhou Passos Manuel num dos melhores governos que o país já teve até hoje. Foi Garrett que influenciou a Rainha para atribuir à cidade o brasão liberal, que a cidade, durante quase um século manteve. Só foi abolido pela ditadura de Salazar, em 1941. O brasão liberal da cidade é aquele que se encontra no distintivo do Futebol Clube do Porto, foi atribuído pela Rainha e com o Garrett por trás. Foi aí que a cidade foi considerada “Invicta” e sempre leal”. Ele fez tudo o que era importante a fazer pela cidade. A cidade deve-lhe isso.

De que forma acha que o Governo pode intervir?

A intervenção só pode ser expropriar, em função do interesse público. O governo está cheio de dinheiro do PRR e poderia atribuir “X” para reconstruir a casa com um projeto interior moderno e funcional, manter a fachada e fazer da casa de Garrett um centro cultural. Há duas possibilidades: a expropriação por utilidade pública e a atribuição do suficiente à Câmara para fazer uma reconstrução com um bom arquiteto, que transforme o interior destruído num centro cultural prático. Depois, é instalar lá a celebração de Garrett e do liberalismo, de uma forma bem organizada, com cabeça, troca e membros.  Há um livro de Garrett, que é “Portugal na Balança da Europa”, em que ele diz uma frase perfeitamente atual: “a pobreza é o maior de todos os males”. Também chegou a dizer que “sem liberdade de imprensa, no estado das nações modernas, no sistema representativo, não há liberdade de nenhuma espécie”, em 1826, acho que hoje ainda é muito válido.

Fotografias: Fernando Andrezo
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