
A escola tem sido, desde sempre, um lugar de transmissão de saberes. Mas num mundo em constante transformação, onde as exigências vão muito além do domínio técnico, é urgente colocarmos a pergunta que não quer calar: estamos verdadeiramente a preparar os nossos alunos para a vida?
Como professora, todos os dias vejo o esforço que fazemos para cumprir programas extensos, garantir metas curriculares e preparar os alunos para provas e exames. Mas também vejo, com igual nitidez, aquilo que continua a faltar: tempo e espaço para ensinar competências humanas, emocionais e sociais.
Ensinamos fórmulas, datas, regras gramaticais — tudo importante. Mas negligenciamos aprendizagens que são essenciais para viver com equilíbrio e propósito: saber lidar com a frustração, comunicar com empatia, resolver conflitos, gerir emoções, trabalhar em equipa ou acreditar em si mesmo.
O século XXI exige mais do que conhecimento técnico. Exige inteligência emocional, criatividade, pensamento crítico, capacidade de adaptação. E, no entanto, o nosso modelo de ensino continua preso a um paradigma onde o erro é punição, o currículo é rei e o aluno é um receptor passivo. A escola ainda privilegia a memorização em detrimento da compreensão, a obediência em vez da autonomia, a nota em vez do processo.
Precisamos de uma escola que não ignore o desenvolvimento emocional dos alunos. Uma escola que compreenda que saber lidar com a frustração, comunicar de forma respeitosa ou confiar em si mesmo são aprendizagens tão estruturantes como a leitura e a escrita. E, para isso, é essencial que a inovação pedagógica deixe de ser uma exceção e passe a ser um compromisso coletivo.
Felizmente, já existem práticas inspiradoras em muitas salas de aula: professores que integram metodologias ativas, que usam o erro como oportunidade de aprendizagem, que trabalham por projetos, que escutam verdadeiramente os seus alunos. Mas são ainda ilhas num oceano de rigidez institucional.
Educar para a vida é educar para o futuro. E isso implica coragem para repensar o currículo, formação contínua dos docentes, mais tempo para o trabalho colaborativo e, sobretudo, uma visão pedagógica centrada na criança como sujeito ativo do seu processo de aprendizagem.
Ensinar para a vida é ensinar a ser. A ter voz, a ter coragem, a ter consciência. E isso começa em práticas simples: permitir que o aluno escolha, reflita, questione, experimente. Valorizar o esforço mais do que a nota. Dar significado à nota ao valorizar todo o esforço que a antecede. Trazer o corpo, as emoções e a curiosidade para o centro da aprendizagem.
A escola não pode continuar a ser apenas um local de instrução. Tem de ser um espaço de construção de identidade, de desenvolvimento de pensamento e de fortalecimento da autoestima. Um lugar onde o saber serve para transformar — não apenas para cumprir objetivos.
Está na hora de redefinirmos o que entendemos por sucesso escolar. Porque o verdadeiro sucesso não é apenas académico — é humano. E é urgente que esse legado comece agora — nas escolas, nas salas de aula, em cada relação educativa.
Isabel Bettencourt
Professora, formadora e coach escolar
Autora do livro “As ideias lunares do Lucca”
CEO da Stratēgia e autora do Podcast “Aula Extra”