“Comer é um ato de amor”
Nutricionista de profissão e também com um grande espírito empreendedor, Ana Bravo é, há já muito tempo, uma cara bem conhecida e querida dos portugueses.
No seu blogue “Nutrição com Coração” partilha, diariamente, dicas e receitas exclusivas que se revelam verdadeiras inspirações, tanto para miúdos como graúdos. De sorriso fácil e com uma serenidade assinalável, abriu-nos o seu coração, em pleno Parque da Cidade do Porto, e falou-nos daquilo que mais a apaixona: a nutrição.
“Comer é um ato de amor”. É com esta filosofia que Ana Bravo, natural de Trás-os-Montes, mas a residir no Porto há já alguns anos, encara a sua vida e a transmite a todos os seus pacientes e seguidores.
Com um percurso profissional assente na área clínica, entre o Norte e a capital, onde se debruça, sobretudo, por casos de excesso de peso e obesidade, revelou à VIVA! que a nutrição não foi, na altura, a sua primeira opção, mas que a fez apaixonar-se de imediato. No entanto, pensando bem, há muito que as borboletas de amor pela área pairavam no ar, afinal, como conta, as suas melhores brincadeiras foram sempre “no meio dos tachos”. “Só sou feliz onde há comida boa. Não adianta estar num lugar paradisíaco se não tiver comida #saudávelefeliz – como lhe chamo -, porque não consigo usufruir da beleza do lugar. A comida alegra os meus dias e também é esse o motivo pelo qual gosto tanto de ensinar as pessoas a comer e sobretudo a fazerem desses momentos atos de amor”, explica.
Pioneira no mundo da blogosfera em Portugal, foi a primeira nutricionista a criar um blogue onde expunha a sua alimentação e partilhava algumas receitas.
O “Nutrição Com Coração”, slogan que surgiu “diretamente do coração”, é hoje uma marca de referência, que extravasou de um simples endereço eletrónico para o Facebook, Instagram, Youtube, uma aplicação móvel e uma rubrica semanal num jornal diário. Ao lado da Kiki, sua amiga de infância e braço direito da Cozinha com Coração, cria e testa todas as suas receitas, desde pequenos-almoços e lanches, sopas, snacks, sugestões de almoços e jantares assim como sobremesas. Apreciadora de uma alimentação focada e equilibrada, Ana Bravo afirma que não é, de todo, fundamentalista e por isso admite exceções. “Comer não deve ser mais uma preocupação excessiva e constante; deve fazer parte do nosso dia a dia da forma mais natural e agradável possível”, destaca.
É, também, nos seus livros que transmite muito do que é enquanto profissional e pessoa, em particular neste último, o sétimo, lançado no passado mês de fevereiro e intitulado “Nutrição com Coração: Equilíbrio interior para uma alimentação saudável”, onde revela a sua história e desnuda a alma para mostrar o que é “mais importante para seguir uma alimentação saudável a longo prazo, sem demasiadas regras e expectativas”. Importante ainda referir que, em 2018, Ana Bravo foi distinguida como uma das 12 personalidades portuguesas que promove a saúde pública.
Em conversa com a VIVA!, a nutricionista de figuras públicas bem conhecidas, como a atriz, modelo e apresentadora de televisão Rita Pereira, desvendou vários segredos da nutrição e partilhou alguns que lhe poderão ser muito úteis para viver o presente e, sobretudo, preparar o futuro.
Quais são os melhores e os piores alimentos para a saúde?
É difícil fazer essa distinção, pois em muitas situações depende da tolerância individual. De uma forma geral alimentos ricos em sal, açúcares e gorduras de origem animal serão os mais prejudiciais, enquanto os alimentos de origem vegetal como a fruta, hortícolas, cereais integrais, leguminosas e oleaginosos estão do lado dos alimentos mais favoráveis.
Quais os erros que não devemos cometer na nossa alimentação?
Podia criar uma lista bastante longa, tendo em conta aquilo que vou identificando na minha prática profissional. Mas resumia em: comer poucas vezes, muito de cada vez, e alimentos pobres nutricionalmente, sobretudo os que em simultâneo têm muitas calorias.
Há alimentos proibidos?
Não sou apologista da existência de alimentos proibidos. Há apenas alimentos desaconselhados para pessoas que comprovadamente têm má tolerância a alguns deles. E depois há aqueles que todos sabemos que não têm interesse nutricional e muitas vezes têm uma densidade calórica muito elevada, mas, mesmo assim, não são proibidos. Devemos evitar o mais possível, sim, mas podemos abrir uma exceção de vez em quando e dela guardar apenas a boa memória, o prazer que nos deu. Comer é um ato de amor, não um conjunto de regras que nos aumentam a pressão diária em que vivemos. Só deve transmitir boas sensações. Devemos fazer as melhores escolhas, sim, mas garantindo sempre que nos sabem bem.
“Um estilo de vida saudável é a melhor forma que temos de tentar garantir um futuro com saúde, ou pelo menos com qualidade de vida. Pensamos no presente e preparamos o futuro”.
Saltar o pequeno-almoço é prejudicial à saúde. Verdade ou mito?
O pequeno-almoço é a primeira refeição do dia e pode ser ingerido até duas horas depois de se acordar e pelo menos duas horas antes do almoço. Dá-nos margem de manobra para incluir como pequeno-almoço alguns snacks que já fazemos tardiamente na manhã. E se acordamos às 10h00 e almoçamos às 12h00, não faz sentido tomar pequeno-almoço, por exemplo. Passar muitas horas sem comer é sempre desaconselhável, seja a que hora do dia for.
E um bom pequeno-almoço deve ser composto por que alimentos?
Alimentos de vários grupos alimentares e não apenas a monotonia do laticínio associado ao cereal e à fruta, embora esse seja o mais comum.
O número de pessoas que, atualmente, adere ao vegetarianismo ou ao veganismo é cada vez mais significativo. Pode haver alguma repercussão na saúde ao excluir-se totalmente a carne da alimentação?
Se for apenas a carne não. Se se excluir o pescado, os ovos e os laticínios é preciso mais atenção no que respeita à ingestão dos restantes alimentos, de forma a garantir o aporte de todos os nutrientes. Mas mesmo para um vegetariano puro – dieta e modo de vida que cada vez respeito mais – é possível encontrar no mundo vegetal equilíbrio nutricional, no entanto tal transição deve ser feita com um nutricionista. Pode haver necessidade de reforçar a ingestão de certos alimentos e é importante saber conjugá-los. Muitas vezes também o médico deve intervir, para perceber se é necessária suplementação além da de vitamina B12 (que não existe no mundo vegetal).
Qual a sua opinião em relação ao consumo de carnes vermelhas?
Devem ser reduzidas a uma ou duas vezes por semana e a uma porção pequena.
Os especialistas dizem que uma boa educação alimentar deve começar em casa e desde tenra idade. Considera que, atualmente, atendendo ao ritmo frenético da sociedade, isto pode estar um pouco esquecido? Se sim, como podemos alterar essa rotina?
Sim, está cada vez mais esquecido. Aliás, a existência de hábitos familiares, sejam eles de que ordem for, estão esquecidos. A unidade familiar, da forma que a conhecíamos, tende a desaparecer. No meio da azáfama diária devem-se reservar momentos de família e esta deve criar hábitos e rotinas, bons de preferência.
Como podemos incentivar os mais novos a consumirem mais legumes? Qual é o segredo para que os consumam por gosto e não por obrigação?
Os hábitos criam-se desde cedo e as crianças educam-se muito mais pelo exemplo do que pelo que ouvem. Eu uso muito purés com o hortícola que a criança não aprecia ou peço para preparar pratos bonitos, com desenhos. Há algum tempo fizemos um teste em escolas de Vila Real, com hortícolas que frequentemente as crianças rejeitam, como espinafres e beterraba. A Kiki preparou muffins verdes e outros cor de rosa. Muitos adoraram e ficaram espantados quando souberam o que tinham comido. Isto abriu a porta para eles testarem novamente estes alimentos porque tiveram uma boa experiência.
Qual é a dieta que, na sua opinião, os portugueses deviam seguir?
Há várias formas de um ser humano se alimentar saudavelmente, sendo necessário, para tal, que todas as necessidades nutricionais sejam atendidas. Assim, cada pessoa será livre de escolher a forma como pretende alimentar-se e o padrão alimentar que quer seguir, desde que o faça de forma consciente, após avaliar os prós e contras do padrão por que optou. Além de cobrir as necessidades nutricionais, será igualmente importante que esse padrão não inclua alimentos supérfluos em abundância, o que desencadearia excesso de peso e, sobretudo, que a qualidade dos alimentos seja tida em consideração. Para tal, os princípios fundamentais serão evitar o sal, os açúcares de adição e na generalidade os produtos muito processados, sobretudo os mais ricos em gorduras trans e aditivos artificiais. Naturalmente as exceções existem. Não faz sentido que uma dieta – cuja palavra significa “modo de viver” – se torne um modo de viver infeliz. Não devemos ser reféns de demasiadas regras alimentares impostas, a menos que tenhamos uma doença que implique uma terapia nutricional específica. É certo que a alimentação é um dos primeiros e principais determinantes de saúde/doença, mas o equilíbrio é a solução. Creio que uma parte do papel do nutricionista passa justamente pela capacidade de perceber o que as pessoas são – “nós somos o que comemos” – mostrando depois caminhos que as ajudem, sem os tornar penosos. Não me parece ideal apresentar uma lista infindável de “alimentos proibidos”. Devemos adaptar a alimentação à nossa vida e não a vida à alimentação.
Aproximamo-nos de uma data que também costuma ser de alguns excessos, a Páscoa, qual o segredo para resistir às várias tentações que ela acarreta? Ou corrigir, depois, os males que se cometem nesse período?
Consciência alimentar. Comer de forma mais racional. É errado pensar que o que se come nas épocas festivas está errado, ou que é um “pecado”. As pessoas têm de aprender a comer sem sentimento de culpa, a comer com amor. Não devem é comer diariamente como se fosse Natal ou Páscoa o ano inteiro.
Verdade ou mito?
Beber água morna com limão em jejum ajuda a emagrecer
Mito
O pão engorda
Mito
Carne faz mal à saúde
Mito
Comer fruta depois da refeição engorda
Mito
O mel engorda menos do que o açúcar
Verdade
Não se deve comer hidratos depois das 18h00
Mito
Beber água às refeições engorda
Mito
Chã verde emagrece
Mito
Comer rápido engorda
Mito
Fazer exercício físico em jejum é bom para perder peso
Mito
Conselhos
Ana Bravo deixa algumas dicas práticas para se cozinhar nas alturas festivas de forma mais saudável, mantendo o sabor de que tanto gostamos:
Nos doces
– Substituir uma parte ou a totalidade da farinha por integrais ou misturas;
– Não usar açúcar branco, preferir mascavado ou idealmente usar stevia (ou uma mistura de ambos);
– Para adoçar bolos também pode usar puré de fruta ou fruta ralada.
Chocolates
– Selecionar os que têm mais de 70% de cacau, idealmente adoçados com stevia.
Em relação ao sal
– Usar o mínimo possível (ou não usar). Utilizar bastantes ervas aromáticas, ajuda.
Deve-se ainda
– Variar os alimentos;
– Não exagerar nas quantidades;
– Preparar as suas próprias receitas, sempre que possível, pois desse modo sabe-se exatamente que ingredientes foram utilizados.
O importante é sempre, logo de seguida, retomar a rotina alimentar, planear a alimentação diária sem esquecer a importância do pequeno-almoço e das merendas. O meu conselho é “seguir em frente guardando apenas o prazer que as exceções proporcionaram”.